Uma das dúvidas mais escutadas por consultores que analisam o passivo tributários dos clientes é: “posso perder meus bens por causa das dívidas da empresa?” E a resposta sempre é: “depende”.
Isto porque deve haver uma autonomia entre a pessoa física e a pessoa jurídica. A pessoa jurídica possui direitos e obrigações próprias. E como titular de direitos, pode possuir bens próprios que não se confundem com os bens dos sócios.
No entanto, se o sistema geral reconhece a autonomia e independência da pessoa jurídica, em quais hipóteses o patrimônio pessoal do empresário será chamado a responder pelas dívidas da empresa? Vejamos as hipóteses previstas na legislação:
O art. 134, do Código Tributário Nacional (CTN), que fala sobre a “responsabilidade de terceiros”, diz – no seu inc. VI – que os sócios serão responsáveis pelo cumprimento das obrigações tributárias no caso de impossibilidade da exigência pelo devedor principal, respondendo solidariamente, nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis, nos casos de liquidação da sociedade de pessoas.
Importa que esta regra do CTN é expressa em relação à liquidação (extinção) da sociedade de pessoas (e não sociedade de capitais, tal qual uma S/A de capital aberto).
Neste caso, conforme os termos da lei, basta que haja a extinção lícita da sociedade de pessoas para que as obrigações pendentes da pessoa jurídica sejam direcionadas aos sócios.
O parágrafo único do mesmo dispositivo faz uma ressalva: neste caso, os sócios responderão somente pelo valor principal (valor da dívida) e, no tocantes às penalidades, as de caráter moratório (atraso) e não nas de caráter sancionatório (sanções por ato ilícito), cuja regulamentação é referida no art. 136, do CTN.
Depois, o art. 135, do CTN, refere que são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, os sócios, os mandatários, prepostos e empregados e os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Neste caso, não se trata do cometimento de atos lícitos, mas de atos realizados em violação da lei, contrato social e estatutos.
No dia-a-dia, percebe-se os casos mais destacados para aplicação de tal regra:
- o encerramento ilegal de atividades (quando simplesmente se encerram as atividades da empresa, fecham as portas, sem dar baixa nos registros administrativos e fiscais exigíveis);
- mudança de endereço sem comunicação das autoridades competentes e;
- a mais comum, a confusão patrimonial entre os bens da sociedade e os bens dos sócios (exemplos: sócio administrador que compra carro em nome da empresa e faz uso pessoal do mesmo, ou que paga contas pessoais com a conta bancária da empresa e vice-versa).
O Superior Tribunal de Justiça possui, inclusive, matéria decisória sumulada a esse respeito. Veja-se que diz o enunciado 435 do STJ: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.
Essas hipóteses são expressamente previstas na lei tributária e, conforme entendimento do STJ, dispensam a aplicação do procedimento de desconsideração da personalidade jurídica pelo Poder Judiciário para responsabilizar o sócio e buscar seus bens pessoais para pagamento da dívida tributária.
O procedimento de desconsideração da personalidade jurídica, ferramenta prevista no art. 133 do Código de Processo Civil, que tem fundamento no art. 50, do Código Civil Brasileiro, só precisa ser utilizado, em se tratando de dívidas tributárias, quando houver situações de fraude, abuso ou execução de atos ilícitos não previstos nos art. 134 e 135, do CTN (exemplos mais vistos: deslocamento da responsabilidade para grupos econômicos ou responsabilização de “sócios ocultos”, ou seja, aqueles que não estão expressamente registrados no contrato social, mas que possuem comprovada atuação na gestão da empresa).
Por tudo isso, quando surge a pergunta sobre a responsabilidade pessoal do sócio sobre as dívidas da empresa, a resposta vai depender da verificação dos elementos acima, ou seja, a aplicação dos art. 134 e 135, do CTN.
Então, não havendo a observação desses elementos expressamente previstos na lei, os bens pessoais do sócio não devem responder pelas dívidas da empresa.
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